sexta-feira, 1 de maio de 2009

trovadorismo

É muito difícil usar as formas dos primeiros trovadores (os de Provença) e não soar repetitivo e convencional, pelo simples motivo que já fazem mil anos que a gente é obrigado a ouvir diluição da corte amorosa que eles simulavam nas músicas mais bregas e nas novelas e filmes menos recomendáveis. Eu tentei alguma coisa nessa área e o resultado foi desigual. No meio das imagens padrão acho que consegui encontrar uma ou outra coisa mais interessante. Nesse poema, me baseei mais no Bernard de Ventadorn porque ele era um mestra da imagem forte e profunda, rescindido Santo Augustinho. Óbvio que não cheguei nem perto, mas aí vai:

Se encontro com o meu Amor,
seus cílios estão abaixados,
o pescoço um pouco dobrado
e os lábios não todo fechados,
me olha com tanta doçura
que em contraste até o sol declina,
torna-se néctar estricnina,
taça de ambrosia amargura.

Nas faces vem tanto calor,
ficamos tão avermelhados
que placas de metal soldado
num foguete despedaçado
n’órbita de uma lua escura
são pedaços de cartolina
rasgados sob a chuva fina
diante da nossa ternura.

Em uma cidade ao redor
o chão de conchas foi calçado,
prédios de corais levantados,
centro com jóias marchetado
onde a luz as cores satura.
Lá no meio a minha menina
bem mais que as pedras se ilumina,
mais que a aurora frescor e alvura.

Quando vi sol com resplendor
me senti como um esmagado,
caí no chão ajoelhado
chorando por ter sustentado
Amor que chega das alturas
devassando pontes, esquinas,
campos, cavernas e colinas.
Vem revirando as sepulturas.

O toque purificador
do Amor se estamos enlaçados,
no meu espírito engendrados
mil sóis num fundo ensangüentado
tornam a terra inteira pura.
Do mar da sua pele fina,
asas douradas na retina
me entregam nos céus suas juras.

Em meio à estranha neblina
o nosso corpo se obstina
em medir da vida a largura.

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